segunda-feira, 9 de outubro de 2017

As melhores práticas para quem vai pra Cuba


Conheci recentemente a professora Martha Daisson Hameister, do Departamento de História da UFPR, ao fazer parte da banca de uma orientanda dela. Quando ela viu que eu vou pra Cuba em dezembro, de férias, me deu as melhores dicas, realmente muito generosas.
Parece que todo mundo já foi pra Cuba menos eu, e todos que foram amaram e estão me presenteando com excelentes sugestões. Mas as da Martha foram as mais completas e práticas. Então deixo-as aqui com vocês. Vai que elas ajudam mais "mortadelas que obedecem aos inúmeros pedidos de 'Vai pra Cuba!'".

1) Varadero é caro e cheio de turistas. Mas há praias pequenas perto de Havana, como Santa Maria del Mar, que se pode ir pela manhã e voltar à tarde. Na época, ida e volta custava pouco mais de 10 reais. Deves levar a "farofa" -- sanduíches e principalmente água -- pois como em toda praia, tem o que comer, mas custa mais caro.
2) Para hospedagem, o melhor lugar é ficar em uma casa no bairro VEDADO [muitos brasileiros recomendam também Havana Velha]. Fica perto do Malecón [a orla de Havana], tem muitos serviços, caixas eletrônicos, padarias e vida noturna. 
Há bons cafés, bares e restaurantes. Há a sorveteria Copélia -- a favorita de Fidel -- embora eu não tenha encontrado outra... 

Uma amiga se hospedou com filha e sobrinha adolescentes nessa casa, mas nesse site há outras tantas. Vedado e toda Havana é muito segura. Passeia-se a qualquer hora do dia ou da noite sem maiores preocupações. Caixa eletrônico não tem porta, por exemplo. 


Eu fiquei numa casa de uma senhora de uns 70 anos que foi alfabetizadora do exército cubano. Alfabetizava soldados e civis como sua missão revolucionária. 15 dias de convívio com as pessoas em seu próprio meio dão mais conhecimento do que um curso inteiro sobre isso. Aliás, perguntei-lhe se não temia pela cooptação de jovens e ataques às conquistas cubanas após as negociações com EUA. Ela fez um discurso inflamado sobre a ciência que os cubanos, jovens e velhos, têm sobre os benefícios da revolução, da saúde para todos, da educação para todos e tanta outra coisa. Concluiu: "Y se no les gusta Cuba, que se vayan todos para allla".


3) Querendo ou não, se emagrece em Cuba. Nada de comida a la carte farta. O que há são excelentes PFs, arroz, feijão, carne de porco, frango ou ovo e alguma salada. Muito difícil comer carne de gado. São reservados basicamente para o leite, que é distribuído gratuitamente para crianças, gestantes, lactantes, idosos ou sob prescrição médica. Se és viciada em leite, leva leite em pó. Leite é CARÍSSIMO em Cuba. Algo como 40 reais uma latinha de leite Ninho. 


4) Toda água de Cuba é tratada. O problema são encanamentos velhos, muitas vezes de chumbo e as caixas d'água precárias. Portanto, é bom comprar água ou apanhá-la nas garrafinhas nas torneiras ao rés do chão -- em praças, jardins ou coisa assim -- a água que ainda não subiu para a caixa nem passou pelos canos de chumbo. Ainda assim, há casas que já trocaram os encanamentos e caixas d'água e, portanto, não há problema maior em consumi-la.


A água em Cuba custa 1 CUP meio litro (é cara, porque 1 CUP = mais ou menos 1 dólar). Mais barato se pegar garrafa grande. Ultimamente, tenho resolvido meus problemas com água em viagem -- como você, também bebo muita água e gasto muito em água. Imagina, um mínimo de 5 dólares/dia em água -- após essa viagem a Cuba. Comprei uma jarra-filtro de carvão ativado e levo junto. Coloco algumas peças de roupa -- camisetas, toalha ou o que seja, dentro e em torno dela para não quebrar. Essa aqui, ó. Comprei em uma loja da própria filtros Europa. Há refil para o filtro do carvão. 

Na primeira viagem ela já paga seu preço! Tem também a garrafinha filtro individual para os passeios.


5) Ao contrário do que dizem, há sim material de higiene, embora caros para turistas. Convém levar uns sabonetes a mais, pois é um bom presente para as pessoas encantadoras que irás conhecer. Não há mosquitos (como me apavoraram quando eu estava para viajar). Não há necessidade de repelentes.


6) LIVROS: há boas livrarias e sebos em Vedado. São MUITO baratos e vendidos pelo peso cubano e não pelo turístico. Saí com 2 sacolas de livros e gastei em torno de 30 reais no câmbio da época (2015).

7) Dinheiro em papel: melhor levar EUROS. O dólar tem um ágio de 10% ou 20% como retaliação ao embargo. Euro pega um câmbio melhor. 


Depois disso, é bom trocar uma quantia de CUCs -- dinheiro de turista -- por CUP -- dinheiro de cubanos para as pequenas despesas. Muito cuidado pois o design das notas é muito parecido. Minha observação para não entregar o dinheiro errado: CUC tem monumentos nas notas. CUP tem as personagens em "retrato". (Algo como CUC tem monumento a Che Guevara e CUP a efígie do Che Guevara). 

Tem casa de câmbio perto da sorveteria Copélia, perto do hotel Habana Libre. Tudo o que conseguires pagar em CUP vais pagar mais barato. Ah, reserva um troquinho para trazer as notas de 3 CUP para presentear amigos: ela tem a efígie do Che, é uma boa lembrancinha de viagem.


Esse conversorzinho aqui é de grande valia para ver qual a situação mais vantajosa, se dólar ou euros. Nós optamos por levar euros, que fomos comprando no Brasil aos poucos. Essa outra páginaapresenta por cidades no Brasil a cotação e quais as casas de câmbio que têm melhores taxas. Não adianta levar cartão de crédito para Cuba, que ainda não são muito aceitos.


8) Há pequenos comércios para cubanos e nesses se paga com peso cubano, a menos que te cobrem em CUC. Pão e outras coisas dessas são comprados de modo mais barato. Só tem que descobrir onde ficam. Frutas como manga, banana, abacate são vendidas na rua, por vendedores que passam de carrinho de mão. Alguns, ao verem que és turista, vão tentar aumentar o preço. Não paga. Lá há o "a peso", ou seja, uma unidade = 1 CUP. 


Ônibus urbanos são legais, meio aventura, são pagos em CUP ou se não tens dinheiro trocado, não precisa pagar. Não tem cobrador. Tem uma caixinha para botar o dinheiro -- muito pouco,baratíssimo (cerca de 1 CUP, ou 16 centavos de real) -- que funciona como um "pote da honra". O passageiro põe o dinheiro da passagem ou não põe. Num ônibus que peguei havia o aviso de que podes ir sem pagar se estás sem dinheiro, fica para a próxima o pagamento.


9) Se fazes uso de algum medicamento, leva junto. Não se compra medicamentos sem receita médica em Cuba, nem dipirona para a enxaqueca. O serviço de saúde é excelente, mas não abrange os turistas. Leve lenços de papel para emergências de ir ao banheiro quando estiveres em algum passeio. Embora nunca tenha entrado em um banheiro sem papel higiênico, isso pode acontecer. 


Também o papel higiênico não é tão suave... convém ter um rolinho na bagagem. 

Quando deixamos a casa em que estávamos, a dona recolheu tudo aquilo que não levaríamos: sabonete em uso, o resto do papel higiênico, sacolinhas de supermercado... aí, dei para ela a sobra do meu leite em pó e os xampus que dariam mais trabalho em trazer de volta do que deixar lá. Ficou muito agradecida.

10) Há muitos espetáculos na rua ou em teatros, baratos ou gratuitos, e os cubanos adoram informar sobre eles. 
11) Um pouco de cuidado em uma prática de exploração de turistas: um cubano se oferece para te levar a algum lugar, bar, restaurante, casa de espetáculos. Lá ele começa a pedir comida e bebida e a conta recai no turista.


12) A parte ruim: cuidado com os motoristas de táxi chamados "máquinas" apanhados na rua. É só preciso ficar atenta. Há uma quadrilha de taxistas especializados em roubo a turistas. Ou sequestro de bens. Quando fui para a rodoviária (incluímos Guantanamo no roteiro), o taxista me "ajudou" a tirar a bagagem. Eu alcançava a mochila e a bolsa de viagem e ele em vez de colocar na calçada ou entregar ao meu companheiro de viagem, colocou no banco da frente. Na mochila estavam meus documentos: passaporte, visto de entrada, etc. 


Precisei fazer um enorme de um drama, chorar e dizer que era professora e que o sonho da minha vida, conhecer Cuba, havia virado um pesadelo. Outros taxistas se "mobilizaram" e localizaram o táxi. Óbvio que pediram uma propina, pois haviam gasto gasolina, deixaram de fazer corridas etc. Resolvido o problema, uma outra turista/cubana que vive na França, começou a gritar que haviam sumido os presentes que levava para a família em Santiago. Roubaram garrafas de vinho, roupas e mais coisas que são custosas em Cuba, como chuveiro elétrico. 

13) Essa foi a única experiência ruim que tive e portanto, te alerto para ter cuidado. De resto, pegamos táxis compartilhados na rua, paga-se muito barato. 
Vai um número grande de pessoas ou o táxi para para apanhar mais gente. É bom, se conhece mais pessoas, conversa-se sobre a vida, o universo e tudo o mais. Os cubanos são muito cultos, pode-se conversar sobre a política brasileira ou cubana com um camelô ou com uma senhora parada na rua que cuida das crianças que estão jogando bola...


14) Incluí Guantánamo na viagem porque há anos me correspondo com um cubano que tem o mesmo sobrenome de minha mãe e que me achou na rede. Como ir a Cuba e não visitá-lo? Foi uma aventura e tanto. Viajar dentro de Cuba sai caro para turistas (há preços de passagens diferentes para turistas e para cubanos) e foi quando eu passei o perrengue do sequestro dos bens no terminal dos ônibus em Havana. 


A viagem foi de 3 dias e foi ÓTIMA. Conheci a sua família, passeamos por praias no sul da ilha, conheci uma cidade muito musical (toda Cuba é), com cafés que após o entardecer se tornam em uma praça de dança, na praça mesmo,  na frente do café, com rumba ao vivo e gente de todas as idades dançando. Músicos de excelente qualidade, pois o ensino da música também é gratuito em Cuba!


15) Ah, sobre assédio na rua, que é muito comum em Cuba: a sobrinha adolescente da minha amiga, jovem, creio que com 17 ou 18 anos, ruiva, lindinha, estava revoltada com os psiu, hermosa, guapa, etc de assediadores que por vezes a seguiam por uma quadra ou mais. Aí ensinei para ela a chave do mistério: dizer em alto e bom som "no me molestes". Cubanos chegam, jogam o xá-lá-lá sedutor ou assediador, mas respeitam o não. Não só esses assediadores, mas também os bêbados inconvenientes -- bebe-se e fuma-se muito em Cuba, terra do rum e dos tabacos. Resolve-se o problema com "no me molestes". 

16) A população e a polícia são desarmados. Pouquíssimos homicídios, em geral passionais ou briga de bêbados ou em família e com arma branca. São latinos, né? Fazem escândalos por dor de amor, brigam, gritam, etc. Mas não há muitos casos de homicídio. 
Policiais são policiais, mas são gentis (muito gentis perto dos que conhecemos por essas paragens). Também têm atenção especial com os turistas. Meu companheiro de viagem, gay, estava conversando com um rapaz na frente de uma boate. Os policiais chegaram, pediram documento de ambos e perguntaram se o rapaz lhe havia pedido dinheiro ou alguma outra coisa, ao que ele respondeu que não, que estava pedindo informações ao rapaz e que esse estava sendo muito gentil em responder-lhe. Os policiais foram embora, desejando boa estada em Havana e que procurasse a polícia caso tivesse qualquer problema. Foram um pouco mais duros com o rapaz cubano, mas não foram truculentos nem mal educados. 


17) Há bastante tolerância aos gays, há show de transformistas em casas noturnas. Esse amigo meu ficou pasmo. Teria um show nessa boate e ele entrou para ver. Um cantor lírico gay fez uma apresentação a capellla maravilhosa, de trechos de ópera de Mozart! Na boate tinha muitos namorados, fazendo namoro de sofá, mãozinha dada e olho no olho com paixão.


18) Cubanos são dados a pedir coisas. Não se trata de miséria ou exploração. Eles são generosos também e estão acostumados a se socorrerem mutuamente. Um dá um isqueiro, mas amanhã poderá estar pedindo parafusos ou pregos. É um hábito que não deve ser encarado como afronta e exploração, mas como uma cooperada forma de driblar a carência de certas coisas.


19) Ah, lembra da tua infância, quando apareceram as sacolinhas plásticas de supermercado? A mãe lavava e deixava secando para usar de novo? [Não lembro disso, Martha!] Pois bem, em Cuba fazem o mesmo. Não possuem indústria de produtos plásticos e se pode ver muitas sacolinhas secando nos varais. Leva sacola retornável para carregar o pão, a água e outras coisinhas dessas. 


Em geral, os produtos não são embrulhados ou são embrulhados em papel de armazém (lembra disso também, né?). [Ok, isso sim!]. Leva algumas sacolinhas plásticas para coisas que são molhadas ou podem vazar. 

Ao final da viagem, o que deixares lá, sacola retornável ou a plástica, será bem apreciado por quem as receber. 
20) Levei para o "primo" de Guantanamo uma sacolinha de evento que organizei, aquelas de algodão cru, com o material do evento dentro: bloquinho, caneta e o caderno de resumos. Ficou muitíssimo agradecido por tudo. Os materiais escolares o governo fornece, mas... ele não é mais estudante. Ele adotou a sacolinha como seu porta-coisas de todo o dia e o bloco e a caneta também foram muito bem recebidos. 


A gente vive há tanto bom tempo na abastança dos objetos de consumo e com dinheiro para comprá-los que esquece como era o tempo em que tudo pesava no orçamento. Cuba evoca essas lembranças de infância.

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